terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O Labirinto do Fauno

"Melhor é derramar o seu sangue do que o sangue de um inocente"



O complexo comercial de Interlagos, localizado na região sul de São Paulo, realizará entre os dias 13 e 16 de janeiro de 2011 um concurso cultural sobre Contos de Fadas, cujos prêmios serão dois carros 0km. Para saber mais, acesse o blog do Shopping: www.interlagos.com.br/novidades/ Inclusive, se você decidir participar, aviso que concorrerá com minha cunhada que está empenhada nos estudos, logo se esforce (apesar de que já darei pequena ajuda nesse post)!

O concurso me fez lembrar de um dos meus filmes favoritos: O Labirinto do Fauno, do cineasta mexicano Guillermo Del Toro e ganhador de 3 Oscars (fotografia, direção de arte e maquiagem). Para quem não viu, assista o trailer no youtube: www.youtube.com/watch?v=M09mCcVgrsA . Nele é narrada a história de Ofélia (Ivana Baquero), menina dos seus 12 anos, quieta e sonhadora, a qual vive no cenário da sociedade espanhola de 1944, após a guerra civil. Buscando fugir da realidade insuportável do medo do padrasto, da violência social e da preocupação com a mãe grávida, apega-se aos livros e encontra no pensamento mágico, típico da criança, um modo de tentar lutar contra o mal que a cerca.

Um conto de fadas, segundo Sheldon Cashdan, autor de Os Sete Pecados Capitais nos Contos de Fadas, é uma jornada em busca da auto-descoberta. A narrativa do filme assemelha-se a um conto de fadas moderno, e é divida portanto em quatro fases:

1) TRAVESSIA: o Herói, nossa pequena espanhola, vai a uma terra diferente, longe de seu lar. Sua mãe Carmen (Ariadna Gil), grávida do filho de um comandante militar fascista Vidal (Sergi López), vai morar num quartel/fazenda sob o comando dele, um insensível tirano.

2) ENCONTRO: com medo das ameaças que a cercam, Ofélia se fecha em seu mundo de imaginação literária, onde encontra o Fauno, ser meio homem, meio cavalo; meio amigo, meio inimigo. Este revela que a menina é a última de uma raça antiga, uma princesa que retornou e pela qual muito tempo esperou-se.

3) CONQUISTA: desafiada pela criatura, a menina entra numa sequência de 3 desafios a serem completados antes da Lua Cheia, para que receba novamente o trono e possa triunfar sobre o mal que a cerca.

4) CELEBRAÇÃO: não contarei para não estragar o gostinho de suspense; basta dizer que a vitória final é inesperada.

Muitas são as interpretações críticas atribuídas ao filme (se o fauno é ou não real, por exemplo), e a que estou dando é apenas mais uma, não tendo a pretensão gananciosa de estar certa. Porém, acredito que uma obra de arte é boa quando não parece que nós a estamos vendo, mas ela a nós. Sei que consegui recuperar através da protagonista memórias minhas de infância, nas quais me imaginava uma heroína ao conseguir de maneira mágica amenizar a dureza dos fatos e das pessoas. Nesse sentido, O Labirinto do Fauno traz lições aparentemente infantis para o mundo chamado adulto; é como se Ofélia fosse um canal que traz a criança inconsciente escondida (id) para ser encarada novamente pela persona do eu.

Questões além do escopo individual também são tratadas, especialmente sobre a problemática da tirania dos mais abastados, um fenômeno constante na história humana. O comandante Vidal representa o então governo nacionalista-fascista de Francisco Franco o qual apoiava interesses de latifundiários e católicos; enquanto isso espreita na floresta uma guerrilha de rebeldes defensores das necessidades dos trabalhadores. É interessante notar que enquanto os trabalhadores recebem apenas uma porção de pão diária, Vidal e seus convidados em outra cena se deliciam num farto banquete.

Cena complexa, “intensa e visceral” segundo del Toro, que se refere subjetivamente a esse tema, é aquela em que Ofélia, num dos desafios propostos pelo Fauno, encontra o demônio devorador de crianças, O Homem Pálido: http://www.youtube.com/watch?v=n9YD2PFF31E




Repare que o monstro está sentado diante de uma mesa com muitos alimentos, mas se levanta afim de devorar a garota quando ela faminta apenas colhe uma uva. Nas paredes do salão estão figuras que remetem a ícones religiosos como “Saturno devorando seu filho”, do pintor espanhol Goya. Tal cena representa a descoberta pela garota da realidade da privação dos mais necessitados cruelmente imposta pelos abastados e avarentos.

Característica marcante das obras de Goya é o contraste entre tons claros e escuros, a qual serviu de inspiração para a fotografia do filme, em que nas cenas de realidade, a escuridão predominou, enquanto claras eram as cenas fantasiosas. Nas palavras do diretor, era vital se aproximar, de maneira diferente, do mundo real e do imaginário. Um deveria ser frio, inclusive glacial, enquanto que o outro tinha que ser muito mais quente, mais vivo, desde o ponto de vista estético. O contrate e a aproximação dos dois mundos é outro ponto chave para o entendimento do filme como estética ou como narrativa.

Contos de fadas não precisam ter uma lição de moral final, porém muitos a apresentam, o que acredito se repetir nesse conto em particular. Se houver uma palavra para resumi-lo, esta seria conflito; conflito de tonalidades entre luz e escuridão, conflito ente o feminino e o masculino (Mercedez e Vidal), entre bondade e tirania, entre fome e abundância, conflito interno entre os elementos contraditórios da própria mente, conflito externo entre explorados e exploradores. Entre todos esses, Ofélia assim como cada personagem teve de fazer uma escolha; mas como criança ela representa a esperança, pois “a inocência possui um poder que o mal não imagina”.

4 comentários:

  1. Quero muito ver esse filme agora, não o conhecia. Gostei muito desse ponto de vista:

    "... acredito que uma obra de arte é boa quando não parece que nós a estamos vendo, mas ela a nós."

    =)

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  2. quando assistir, volte e comente de novo! ^^

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  3. Aninha,

    Não conhecia seu blog até esse encontro inesperado às 4.
    Parabéns! Realmente estou muito impressionado com a qualidade da informação e da escrita. Seus questionamentos, muito profundos, me fizeram levantar várias indagações inéditas sobre alguns assuntos que muitas vezes eu me pergunto também!
    Esses temas dão assuntos para vários livros: ainda bem que tem alguém que se dispões a sentar e escrever todos eles hehe
    Obrigado pela experiência!
    bjs

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  4. O filme é excelente =) um dos melhores que eu já vi...e vc sabe ehhee...aliás, já perdi a conta de quantas vezes eu vi. No mínimo umas 4 e com certeza é um dos melhores comentário sobre esse filme q eu ja li..tinha q ser seu =)

    Parabens!!!!!!! vc é demais.!!!
    de verdade..e o layout q vc deixou com as fotos: perfeito..

    beijoss

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