segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Sê o melhor no que quer que sejas



    A essência de uma vida realmente humana (porque há de se concordar que nem todo Homo sapiens vive como um ser humano propriamente dito) é uma busca por sentido nessa loucura aleatória de fatos. Em minha busca por um sentido na Curta Existência, há um poema de Pablo Neruda que me inspira: Sê.

Se não puderes ser um pinheiro no topo de uma colina,
Sê um arbusto no vale mas sê
O melhor arbusto à margem do regato.
Sê um ramo, se não puderes ser uma árvore.
Se não puderes ser um ramo, sê um pouco de relva
E dá alegria a algum caminho.

Se não puderes ser uma estrada,
Sê apenas uma senda,
Se não puderes ser o Sol, sê uma estrela.
Não é pelo tamanho que terás êxito ou fracasso...
Mas sê o melhor no que quer que sejas.


    Longe de apoiar valores globalizados da competitividade capitalista (casa mais confortável, roupa mais estilosa, carro do ano, aparência mais “sex appeal”, e outras mesquinharias), Neruda incentiva o auto-refinamento, ou melhor, a tentativa de cada um em chegar ao seu maior potencial, em ser o melhor que poderia ser. Pinheiro, arbusto, ramo ou relva, cada qual em seu meio de possibilidades. Um portador de Síndrome de Down, por exemplo, tem suas devidas limitações, porém com incentivo e correto apoio, pode ser que chegue a trabalhar e constituir família. Talvez não. Mas ainda sim, no caminho da busca, muito poderá ser realizado, poderá ser vivenciado. Sêneca dizia que se uma flecha for mirada no Sol, provavelmente ela não o alcançará, entretanto certamente chegará mais longe se tivesse mirado um alvo à altura do flecheiro.
    Mas como escrevo esse texto e você o lê, é bem provável que nossas possibilidades sejam bem mais favoráveis do que a de uma dessas pessoas "especiais", como se costuma dizer. Cada devido ser humano, capaz de criticar valores superficiais e de criticar suas próprias atitudes habituais, há de convir que precisa melhorar muito no caráter. Caráter, segundo as mais atuais teorias de personalidade* assim como segundo sábios antigos, é a tríade de seus comportamentos para consigo mesmo (famosa auto-estima), para com o próximo e para com a Espiritualidade. Caráter pode ser e é moldado enquanto houver mente sã por um poderoso agente controlador: o famoso Eu. 
    Sim, porque antes de sermos controlados por qualquer força maior escondida atrás de câmeras, impostos ou sistemas, somos controlados pelo Eu. Sentir raiva, amor, inveja, alegria, gula ou tranqüilidade não é uma escolha; mas a maneira como agir perante os sentimentos sempre é uma escolha. Pensamentos geram palavras, que geram ações, que geram hábitos, que geram caráter. Você não pode impedir que pássaros voem sobre a sua cabeça, mas pode impedir que façam ninho, segundo Lutero.
    Impedir sensações, pensamentos e impulsos é impossível (afinal somos fisiologicamente programados para tê-los), mas controlar que dominem nossas ações é possível, apesar de difícil. E acrescento: poder dominar a si mesmo é a Liberdade em sua plenitude, pois o torna verdadeiro Autor de sua própria história.
    Estrada, senda, Sol ou estrela, cada qual com seus defeitos e qualidades. Eu, Aninha, luto com a impulsividade de ações e de palavras, que já me fez magoar muitos (se não todos) de meus queridos. Luta longa e árdua é essa contra si mesmo. Porém, há dois caminhos: o largo e o estreito. O largo é fácil: viver como manda o corpo, as sensações, os sentimentos, os defeitos, a sociedade. É entrar e sair do planeta, personagem plana, folha ao vento, alimento de vermes. O estreito é penoso, demanda autocrítica, esforço, autocontrole, objetivo, sonhos; requer rever conceitos e agenda; exige parar de olhar para o umbigo e começar a enxergar os olhares do próximo.
     Ou será mesmo que basta passar a vida estudando e trabalhando para saldar as dívidas e assistir ao Faustão aos domingos? Vida umbigocêntrica. Pão e circo. Enquanto isso nas esquinas no metrô mais próximo crianças sobrevivem de crack e migalhas de pão, e a minha e a sua indiferença permanecem, se endurecem. Não desejo ser uma folha ao vento, mas um Pinheiro, ou arbusto, ou ramo, ou relva. Independente do tamanho, ser o melhor no que quer que for. E dar alegria a algum caminho.

2 comentários:

  1. bah, guria, excelente texto...
    é daqueles em que o xirú pára e analisa a si mesmo, sobre o seu papel no mundo e a partir daí vai fazendo uma análise mais profunda e vem arrependimentos, coceiras e pesos na consciencia!!
    e eu tb sou fan de Neruda

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  2. Desculpe, mas há aqui uma informação que necessita de correção. Acontece que este texto vem sendo erroneamente atribuído ao Neruda, mas na realidade é uma adaptação do poema de Douglas Mallock , poeta americano cujo título é Be the best of whatever you are como se pode verificar em
    http://pt.wikiquote.org/wiki/Pablo_Neruda e http://www.inspiring-quotes-and-stories.com/be-the-best-of-whatever-you-are.html
    Ou aqui http://www.rosangelaliberti.recantodasletras.com.br/blog.php?idb=9097

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